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sexta-feira, 12 de julho de 2013

Merecida aposentadoria: Elefanta Lady encontra abrigo em JP após décadas de circo

23/04/2013 | 19h37min

No dia 10 de abril, Lady chegou em João Pessoa. Depois de 35 anos viajando pelo Brasil de cima a baixo e entretendo pessoas, ela vai ganhar um merecido descanso. Uma bela aposentadoria, e o lugar escolhido para o repouso é a Capital paraibana. Ah, sim, Lady é uma elefanta-indiana de três toneladas.
Dentro de aproximadamente três meses, a elefanta será transferida para sua nova casa, no Parque Zoobotânico Arruda Câmara, a Bica. Lá ela terá um recinto apropriado para o seu tamanho e uma alimentação saudável. No momento, Lady está abrigada no Circo Internacional Europeu, que está instalado nas proximidades do Aeroclube, no bairro do Bessa.
O portal Paraíba foi conhecer de perto a nova moradora e saber um pouco de sua história.
Merecida aposentadoria 
Fui para o Circo de manhã cedo acompanhado de um amigo fotógrafo, Theo Craveiro. Logo vimos a elefanta Lady em um modesto espaço, limitado por uma corda. Ela tinha sombra e água fresca e algo me chamou a atenção. Não existia nenhuma corda ou corrente presa às pernas do animal, que costuma ser comum em circos. A elefanta estava "livre", claro, dentro daqueles limites.
Fui avisado de que deveria conversar primeiro com o domador antes de chegar perto do elefante. Me falaram que o animal é dócil, mas que de qualquer forma era bom estar com o domador por perto, então fui procurá-lo. Eu mal podia imaginar o que viria depois.
Me apontaram o "senhor de camisa azul". Me deparei com um homem de cabelos brancos, baixinho, mas com bastante vigor físico. Ele ajudava um rapaz a fixar uma estrutura do circo no chão. Me apresentei e perguntei pelo seu nome, "China", ele respondeu.

Seu China photo _baixa-222.jpg
Seu China, natural de Santos, 71 anos, ofereceu a mim e ao Theo dois lugares sob a sombra de um toldo, de frente para Lady, a elefanta. Ali conversamos por cerca de trinta minutos.
Ele contou que a Lady tem 42 anos e nasceu na Flórida, EUA. Foi adestrada lá e trazida para cá aos 10 anos de idade. Junto com Seu China, eles se apresentaram por todo o Brasil em inúmeros circos. "A gente está nesse circo há dois anos, ela foi doada de outro circo para esse aqui, e eu vim junto".
Em outros circos ela viveu ao lado de outros elefantes, chegando a dividir o espaço com outros cinco animais. “Nos últimos anos eu cuidava da Lady e mais outra elefanta, que acabou morrendo”, contou China.
O domador me explicou que o treinamento do elefante do circo não é mais como antigamente, de "métodos arcaicos". "O segredo é descobrir do que ela gosta, se ela prefere banana ou maçã, ou então um doce. Quando a gente dá o que ela gosta, fica mais fácil. Essa história de bater no animal acabou".
Então, porque João Pessoa? Seu China disse que a carreira de um elefante de circo termina depois que o animal completa 40 anos. "Já estamos há dois anos procurando um lugar para a aposentadoria dela, e o Átila (Pena, dono do circo) gostou daqui. Eu vou ficar alguns dias depois que ela for para o zoológico e depois vou para a minha casa, em Santos, me aposentar".
O domador fez questão de ressaltar que Lady é um animal dócil e é bem tratado. "Quando estávamos em Guarabira, chamaram a Polícia dizendo que o elefante estava sofrendo maus-tratos. A denúncia dizia que o animal estava no sol. Olha lá (Seu China aponta para o "cercado" da Lady), ela não ta amarrada, tem sombra e tem sol, ela pode ir e vir à vontade, se ela ir para o sol, quer dizer que ela não quer ficar na sombra".
"O Ibama já veio até o circo fiscalizar em mais de 40 cidades. Nenhuma vez foi constatado que ela tenha sofrido maus-tratos. Esta elefanta nunca foi mal tratada. Tão dizendo aí que a Lady vai ficar aqui porque o Ibama não deixa a gente ficar mais com ela. Isso é mentira, ela vai ficar aqui porque ela está se aposentando".
Eu o questionei sobre a saúde mental do animal. Afinal, viver a rotina de um circo e viajar dentro de um vagão não parece confortável para um animal, pode ser bastante estressante. "Não, ela é tranquila. Da mesma forma que é para a gente é para ela. Eu cresci aqui, a vida que eu conheço é com o circo, vou me aposentar agora, vou para a casa e não sei o que vou fazer".
"A gente está aqui conversando e eu posso me irritar e te xingar. É uma coisa do momento, não é porque eu vivo no circo. É a mesma coisa com o animal, ela pode se irritar com alguma coisa, mas a vida que ela conhece é isso aqui, ela não é selvagem, ela é do circo. Claro que existem casos de elefantes que enlouqueceram e mataram pessoas, mas específicos. Eu me lembro de um caso que teve em São Paulo que uma elefanta matou o tratador, disseram que ele batia muito nela, machucava mesmo".
O domador falou um pouco sobre a esperteza do animal em momentos de violência. Durante décadas de trabalho com animais, ele viu muita coisa e tem experiência para falar do assunto. "O elefante é um animal inteligente, se ele quiser matar, ele não vai bater de qualquer jeito, ele vai matar. Ele derruba no chão e pisa em cima, ou então esmaga com a cabeça".
Seu China contou que tem um filho que trabalha em uma grande rede de circos nos Estados Unidos, e que lá existe uma fazenda para onde os elefantes vão quando se aposentam. "Meu filho me ligou essa semana e me contou uma coisa difícil de imaginar. Um ambientalista entrou no picadeiro onde tinham seis elefantes, puxou uma arma e atirou contra um dos animais. O bicho foi para a fazenda, se aposentou mais cedo. Mas como que um cara faz uma coisa dessas? Atirar em um elefante?", falou indignado.
O domador deixou bastante claro que não gosta do trabalho de ONGs e ambientalistas que fazem campanhas contra o trabalho de animais em circos. “Eles ficam dando dinheiro para vereadores e deputados criarem essas leis. Mas não existe lei federal que proíba não. Existe nos municípios, mas não todos”.
Ele afirmou que após décadas vivendo no circo, os animais nem sempre se adaptam a outro estilo de vida. “Os animais que saem do circo para viver no zoológico, nem sempre agüentam. 50% acaba morrendo”.
Depois da conversa, fomos chegar perto de Lady. Entramos no 'cercado' logo atrás do Seu China. Ele ficou bem próximo dela, acariciando a face. Eu ousei me aproximar e a elefanta estendeu a tromba, deixando que eu a tocasse com a mão. Logo em seguida virou a tromba para o domador que fez uma gracinha qualquer.
O que aconteceu em seguida foi bastante rápido e assustador. Sem qualquer aviso, a elefanta derrubou Seu China violentamente no chão. Em uma fração de segundos em pensei que estaria vivenciando uma daquelas manchetes de casos violentíssimos em circos em que o animal mata o treinador.

Confira a sequência onde Lady derruba Seu China:

Kiss photo _baixa-4.jpg
Surprise! photo _baixa-5.jpg

Mas o pior não aconteceu, ainda bem. Seu China, que caiu de costas no chão, aos pés do elefante, se levantou o mais rápido que pôde. Ainda assim, me atrevo a dizer que o pior não aconteceu só porque Lady não quis. Após jogar seu domador no chão, a elefanta ficou imóvel e Seu China não deixou barato.
Ele ficou perplexo, descabelado e com o braço arranhado, sujo de terra. “Ela nunca fez isso. Nunca me deu trombada, quanto mais jogar no chão”. As minhas pernas tremiam, mas Seu China não parecia estar com medo, ele se manteve ao lado da elefanta e gritou com ela, deu uma bronca. Como um pai faria com um filho que passou dos limites.
Eu e Theo perguntamos o que poderia ter causado o ataque. Talvez a nossa presença dentro do cercado, ou seria fome ou o calor. “Não, comigo por perto nunca teve problema. Agora tem, né!? Depois disso”.
Eu diria que Lady ficou meio “sem jeito” depois do ocorrido. Após a bronca do Seu China ela se afastou para o canto do cercado e ficou encarando o vazio, parecia uma criança contrariada. Só relaxou quando uma moça do circo chegou para lhe oferecer um lanchinho. Bananas, pães e até biscoito cream-cracker, foram engolidos em segundos.
Despedi-me e agradeci a Seu China pela oportunidade. Enquanto eu e o Théo nos afastávamos, ficamos conversando sobre o que teria causado o ataque da elefanta contra o domador. Talvez ela tenha escutado toda aquela conversa sobre elefantes violentos, ou então Lady está apenas contrariada, após viver 35 anos ao lado de Seu China, não quer dizer adeus.
In the sun photo _baixa-14.jpg

Pedro Callado

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